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Tribunal Regional do Trabalho - 9ªRegião

Tribunal Regional do Trabalho 9ª Região

Página gerada em: 13/07/2025 17:02:38

Em discurso, presidente do TRT-PR critica pejotização em casos de subordinação

Notícia publicada em 07/07/2025
Presidente do TRT-PR, Célio Waldraff, homem branco, de óculos, fala em frente a um microfone no Pleno do Tribunal
O desembargador Célio Horst Waldraff, presidente do TRT-PR, foi enfático na defesa
da competência da Justiça do Trabalho na abertura do Tribunal Pleno na segunda-feira (30).

O presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (TRT-PR), desembargador Célio Horst Waldraff, criticou a pejotização irrestrita durante discurso na abertura do Tribunal Pleno nesta segunda-feira (30). O desembargador ressaltou que as contratações de trabalhadores como prestadores de serviços - com emissão de notas fiscais, sem recolhimento de impostos e sem direitos sociais, como férias e 13º salário - têm acontecido inclusive em casos de atividades subordinadas, o que contraria a legislação. Leia a íntegra abaixo ou assista ao vídeo com o pronunciamento.

"A pejotização enfraquece a arrecadação previdenciária, corrói o regime de solidariedade, distorce os princípios da livre iniciativa e afeta diretamente a coesão social. Promove, na prática, a criação de um contingente de trabalhadores formalmente autônomos, mas subordinados, materialmente falando, desprovidos de proteção mínima e convertidos em mera variável do ajuste econômico", afirmou ele.

Fotografia do Plenário Pedro Ribeiro Tavares com os desembargadore durante a sessão do Tribunal Pleno.
O discurso do presidente do Tribunal, desembargador Célio Waldraff, foi
acompanhado pelos demais desembargadores durante a sessão do Tribunal Pleno.

O discurso reforça a preocupação com a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) no Tema 1389, que trata da legalidade da contratação de pessoas físicas como pessoas jurídicas, e defende a competência constitucional da Justiça do Trabalho para analisar casos de pejotização. "A omissão institucional não é tolerável. É nosso dever como magistrados, defensores da Constituição, permanecermos unidos, atentos e firmes na resistência, em defesa da competência material da Justiça do Trabalho, em defesa da dignidade humana".

Nos dois últimos anos, foram realizadas manifestações da sociedade civil - organizadas principalmente pela Ordem dos Advogados do Brasil, Seção Paraná (OAB-PR) e pela Associação da Advocacia Trabalhista (AATPR) - em frente aos Fóruns Trabalhistas, em defesa da competência constitucional da Justiça do Trabalho. Em maio deste ano, as cidades de Maringá, Cascavel, Apucarana, Foz do Iguaçu, Ponta Grossa, Londrina, Arapongas e Curitiba foram sede de protestos. A mobilização reuniu advogadas(os), magistradas(os), procuradoras(es), servidoras (es) e professoras(es). Clique aqui para acessar e ler o material sobre as manifestações em 2025 e neste link em 2024.

 

Íntegra do discurso do presidente do TRT-PR, desembargador Célio Horst Waldraff, na sessão do Tribunal Pleno em 30 de junho

Senhoras Desembargadoras, Senhores Desembargadores,

Permitam-me algumas breves palavras antes de iniciarmos a pauta de hoje.


Dirijo-me a esta Corte em um momento em que as palavras exigem peso, e o silêncio - por mais confortável que pareça - representaria uma omissão imperdoável. O tempo em que vivemos é daqueles em que o Direito parece vacilar sob o atrito entre os princípios e os interesses, entre o projeto de sociedade contido na Constituição e a realidade que se constrói à revelia dela.


Necessária, portanto, lucidez, coesão e responsabilidade diante de um quadro que afeta diretamente a integridade da Justiça do Trabalho.


A tentativa de esvaziamento da competência material da Justiça do Trabalho, que, até então, nunca fora objeto de dúvida desde a promulgação da Constituição de 1988, configura uma inflexão que precisa ser compreendida não como fato isolado, mas como parte de um processo mais amplo de fragilização das estruturas de proteção do trabalho no país.


O deslocamento da competência da Justiça do Trabalho para a Justiça Comum Estadual em casos de reconhecimento de vínculo impõe barreiras práticas ao exercício do direito de ação. Além disso, a Justiça do Trabalho, com seus instrumentos de oralidade, gratuidade e especialização, foi construída justamente para reduzir assimetrias materiais entre as partes. Subtrair esse ambiente processual do trabalhador é ampliar a desigualdade no momento em que se busca reparação. É negar efetividade a um direito materialmente reconhecido.


A Justiça do Trabalho existe para garantir que a proteção ao trabalhador não seja mera expectativa. O seu esvaziamento, seja pela erosão de sua competência, seja pela relativização de normas que asseguram o vínculo empregatício, não representa modernização. Representa a renúncia a um projeto civilizatório sustentado pela própria Constituição.


O entendimento recente manifestado em algumas decisões, ao relativizar a competência material da Justiça do Trabalho, abre margem para um modelo de Justiça que ignora as especificidades do conflito trabalhista. Mais grave: acena para a possibilidade de normalização da chamada 'pejotização' - não como exceção justificada por situações técnicas específicas, mas como prática autorizada e replicável, inclusive em atividades subordinadas.


Essa perspectiva, se consolidada, produzirá efeitos que ultrapassam a esfera do Direito Individual do Trabalho. A pejotização enfraquece a arrecadação previdenciária, corrói o regime de solidariedade, distorce os princípios da livre iniciativa e afeta diretamente a coesão social. Promove, na prática, a criação de um contingente de trabalhadores formalmente autônomos, mas materialmente subordinados, desprovidos de proteção mínima e convertidos em mera variável de ajuste econômico.


É preciso reafirmar, com base em compromissos assumidos internacionalmente pelo Estado brasileiro, que o direito ao trabalho é um direito humano fundamental. Não se trata de um privilégio regulado internamente, mas de uma prerrogativa reconhecida pela comunidade internacional como base para o exercício de outros direitos civis, políticos e sociais. A Declaração Universal dos Direitos Humanos, o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais e diversas Convenções da OIT, das quais o Brasil é signatário, vinculam o país a um projeto normativo que não se compatibiliza com a informalidade estrutural, nem com formas artificiais de contratação que ocultem a existência da relação de emprego.


A OIT, aliás, tem posição consolidada: o trabalho não deve ser tratado como mercadoria. Isso implica reconhecer que a relação de trabalho não pode ser reduzida à lógica da conveniência econômica das partes, sob pena de reintroduzirmos, por vias indiretas, formas de exploração que a ordem jurídica contemporânea se propôs a superar.


Não estamos diante de um debate técnico. Estamos diante de uma inflexão de sentido na compreensão do papel do trabalho na sociedade contemporânea. Diante disso, a omissão institucional não é tolerável.


É nosso dever, como magistrados, como defensores da Constituição, e como integrantes de um tribunal vocacionado à tutela de direitos sociais, permanecer unidos, atentos e firmes na resistência; em defesa da competência material da Justiça do Trabalho; em defesa do Direito do Trabalho como instrumento de justiça social; em defesa, enfim, da dignidade humana que constitui o alicerce de nossa ordem jurídica.


Concluo reafirmando minha confiança nesta Corte, em sua história e em seu compromisso institucional. E convido cada um e cada uma das senhoras e senhores desembargadores a manterem-se como têm feito: vigilantes, atuantes e comprometidos com a missão maior que nos foi confiada - a de preservar a Justiça do Trabalho como uma trincheira civilizatória em tempos de adversidade.


Muito obrigado pela atenção.

    Texto: Patricia Thomaz / Ascom TRT-PR

    Fotografias: Jason Silva / Ascom TRT-PR